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Fascite Plantar

A fáscia plantar é uma banda espessa composta por tecido conjuntivo que se estende desde o calcanhar (osso calcâneo) até aos dedos dos pés. A sua função é de sustentar o arco inferior do pé e fornecer absorção de choque, tendo por isso um papel importante na biomecânica normal do pé. Durante a marcha o pé tem de ser macio e flexível para suportar o peso corporal da fase de apoio e rígido e tenso para fornecer força propulsiva durante a impulsão. Estas funções opostas são realizadas em grande medida pela fáscia plantar.

A fascite plantar surge como resultado da irritação degenerativa da fáscia plantar e das suas estruturas circundantes. É a causa mais comum de dor no calcanhar, sendo responsável por cerca de 10% das lesões relacionadas com a corrida e 11% a 15% de todos os sintomas nos pés que requerem cuidados médicos profissionais. Acredita-se que ocorra em cerca de 10% da população geral, com 83% desses pacientes sendo adultos trabalhadores ativos com idades entre 25 e 65 anos. Pode-se apresentar bilateralmente em um terço dos casos. Alguma literatura mostra que as taxas de prevalência entre uma população de corredores chegam aos 22%.

Embora esta patologia tenha sido historicamente caracterizada como um processo predominantemente inflamatório (e por isso o sufixo “ite”), a ausência de células inflamatórias sugerem um mecanismo principalmente degenerativo, levando alguns autores a sugerir o termo “fascicose” plantar por ser mais preciso histologicamente. É por isso classificada como uma lesão de sobreuso, isto é, que se deve principalmente a uma tensão repetitiva que causa microrrupturas da fáscia plantar, podendo, no entanto, ocorrer como resultado de trauma ou outras causas multifatoriais. Alguns fatores predisponentes são:

  • Pes planus
  • Pes cavus
  • Limitação da dorsiflexão do pé
  • Pronação ou supinação excessiva
  • Tensão/ rigidez nos gémeos, solhar e/ou outros músculos posteriores da perna
  • Obesidade
  • Atrofia da gordura (tecido adiposo) do calcanhar
  • Envelhecimento
  • Sexo feminino
  • Ocupações que exigem ficar em pé por muito tempo
  • Corredores de fundo
  • Espondiloartropatias soronegativas

Aproximadamente 50% dos pacientes apresentam esporão do calcâneo, mas o esporão em si não é a causa. É hipotetizado que estes são gerados como resultado da resposta adaptativa do corpo para redistribuir as forças de impacto do local de inserção do calcâneo para os tecidos circundantes.

A generalidade dos pacientes apresenta uma história de dor na região medial da face plantar do calcanhar que se desenvolve de forma insidiosa, e que pode irradiar para o arco medial do pé. Esta dor é caracteristicamente pior de manhã com os primeiros passos do dia e ao ficar em pé por longos períodos. Tende a melhorar com o repouso, mas em casos graves os sintomas podem exacerbar com o ficar sentado por longos períodos. Geralmente, a dor diminui com o andar ou o início de uma atividade desportiva, porém aumenta com o uso excessivo e consoante o tempo da atividade também aumenta (como na corrida). Habitualmente, pode ser reproduzida da seguinte forma:

  • Pela palpação do calcanhar (calcâneo) no local da inserção da fáscia plantar
  • Com a flexão dorsal passiva do pé e dos dedos dos pés (nomeadamente do primeiro dedo)

Fasceíte plantar é um diagnóstico clínico e, como tal, o paciente não necessita de realizar exames imagiológicos. Contudo, a radiografia ou ecografia devem ser consideradas caso na anamnese ou exame físico se suspeite de outras lesões ou condições ou se o paciente não melhorar após um período de tempo razoável. Se o paciente não responder favoravelmente à terapia conservadora após um longo período de tempo, deve-se considerar a realização de uma ressonância magnética para avaliar se há rupturas, fraturas de stress ou defeitos osteocondrais.

Numa primeira abordagem é indicado o tratamento conservador, que poderá incluir:

  • Repouso selectivo (da região / atividade), conforme o nível de dor
  • Evitar longos períodos em pé, exercícios repetitivos que traumatizem o calcanhar e o andar descalço, caso a dor seja intensa;
  • Auxiliar de marcha para fazer descarga de peso
  • Gelo
  • Fisioterapia com técnicas de massagem de fricção profunda e alongamento da fáscia plantar, tendão de aquiles, gémeos e solhar
  • Perda de peso
  • AINEs
  • Palmilhas e talas noturnas podem ser prescritas em conjunto com as terapias mencionadas anteriormente

Se a dor não responder às medidas conservadoras, será necessário recorrer a técnicas mais invasivas, como as ondas de choque extracorporeais, injecções de toxina botulínica, plasma rico em plaquetas (PRP), entre outros. Estas técnicas devem ser utilizadas de forma combinada com o tratamento conservador/fisioterapia. Na António Gaspar – Physio Therapy & Performance recomendamos realizar uma consulta de podologia para avaliar a necessidade de obter o suporte de arco adequado para o seu calçado.

A cirurgia deve ser considerada como a última opção, caso as terapias menos invasivas tenham falhado. Geralmente implica a realização de uma fasciotomia, porém, a liberação cirúrgica não garante um bom resultado.

A fascite plantar se não for tratada adequadamente pode ser incapacitante e associada a dor moderada a intensa. A marcha irregular característica da condição pode levar a lesões nas articulações do joelho e anca. Independentemente da opção de tratamento, este deve ser realizado por pelo menos 6 semanas para que possa surtir algum efeito, podendo a resolução dos sintomas levar semanas ou meses. De acordo com a evidência, cerca de 75% dos casos resolvem-se num período de 9 a 12 meses. Em aproximadamente 5% dos casos é necessária a libertação cirúrgica da fáscia plantar, embora os resultados não sejam consistentemente bons.

Bibliografia:

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